Hoje é aniversário do meu filho.
30 anos.
No dia em que ele nasceu eu não estava por perto.
A mãe dele reclama.
Eu tinha um compromisso naquela noite.
Mas existe compromisso maior do que o nascimento de um filho?
Existe. E aquele era imperdível. Inadiável.
Deixei minha mulher, com meu filho ainda no ventre, nas mãos de Deus. Na verdade, nas mãos do médico, no hospital, e tomei meu rumo.
O encontro que eu tinha naquela quinta-feira era religioso.
No Templo Sagrado, local onde aconteceria o tão aguardado ritual, milhares de devotos, ansiosos, se aglomeravam.
Todos vestindo o mesmo manto. Sagrado.
Eu não conseguia tirar o pensamento de Célia e de meu futuro filho. Ou filha. Ainda não sabíamos.
Também não conseguia tirar os olhos do que ia acontecendo, minuto a minuto, na seita religiosa que já havia começado.
Eu não estava de corpo presente, mas meu espírito estava junto à minha família.
E de corpo e alma, entreguei-me à minha segunda família, aquela que, assim como eu, fazia parte daquele culto naquela noite especial. Todos nós, irmãos, nos entregamos aos Deuses. Estávamos nas mãos deles.
Ou nos pés.
Será que está tudo bem com Célia?
Eu estava ficando angustiado no meio da multidão.
Não sabia se estava mais aflito com minha mulher e filho, ou se com os servos do rito.
Eu esperara por aquele momento havia muito tempo. Por aqueles momentos. Pelo nascimento do meu filho, e pelo ritual.
Meus irmãos e eu - sem exagero, eram milhares, dezenas de milhares de fiéis, verdadeiramente fiéis -, tivemos de jejuar para aquela noite sagrada. O jejum era um requisito para aquele encontro.
Sem exagero, jejuamos por 22 anos.
Será que ele nasceu? Ele. No fundo, eu sabia que era um menino.
Será que já nasceu?
O barulho celestialmente infernal anunciava que todos nós, beatos, fanáticos religiosos, protegidos pelo mesmo manto sagrado, a qualquer instante, entraríamos em transe.
No exato momento em que Deus nos presenteou com um lindo e sadio menino no hospital, todos nós recebemos a graça dos Deuses no gigante Templo que acolhia 80 mil fiéis.
Foi o ápice.
Entramos em transe absoluto.
Libertamos-nos.
Os Deuses eram nossos. Eles estavam do nosso lado.
Os Deuses, e os anjos.
E foi através do pé de um deles, do pé de um dos anjos, que chegamos ao êxtase coletivo.
Além dos Deuses, os anjos também eram nossos.
Os seres do além eram nossos.
Foi um instante único.
Mágico.
Esperamos uma vida toda por aquele momento divino.
E valeu a pena esperar.
Quem participou daquele encontro sagrado naquela inesquecível noite de quinta-feira, jamais se esquecerá.
Nossa religião nos proporcionou, ao longo da vida, inúmeros instantes de alegria, euforia e exaltação.
Mas nada se compara àquele 13 de outubro de 1977.
Ficou tudo bem com Célia. Ela entendeu minha posição. Entendeu meu fanatismo.
Meu filho também ficou bem.
E o nome dele, claro, não poderia ser outro: Basílio.
8 comentários:
Grande texto. Belo.
Gracias, Roberto.
Carlão, retribuindo a visita e o link. Ótimo texto, por sinal. De emocionar até quem não torce pelo Corinthians.
Abraços
Salve, Carlão. Agradeço a presença no meu blog.
E, como corintiano que sou, gostei muito deste texto. Parabéns
Abraços
Carlão, não só sou corintiano e amante do futebol, como tbm filho de corintiano. Meu pai, aliás, estava lá onde vc tbm estava nesse dia, o que particularmente muito me honra.
Só não me chamo Basílio..rs
Linda história, cara. Como a do nosso time.
abraço!
Muito bom seu texto.
Fez sua homenagem com muita criatividade.
Grande abraço
dominiodabola.wordpress.com
Belo texto, Carlão. Vi o jogo pela TV, pois meu pai não quis arriscar. Tínhamos ido ao jogo de domingo e acho que ele preferiu apostar na superstição. Afinal tinham sido dois jogos, ganhamos o que vimos pela TV, perdemos o segundo em loco. Só sei que ele acertou na decisão. Salve o Corinthians! Salve o Basílio, o seu, o nosso, o de todos os corintianos... abs
cara, muito foda o texto!
Parabéns...
deu muita vontade de estar lá...
Mas temos que nos voltar pro presente...e ver o Corinthians brigando pra não cair...
excelete texto
Abraços
Postar um comentário