domingo, abril 26, 2015

Sinuca de bico no futebol brasileiro

Pode contar. São raros os times brasileiros que conseguem trocar mais de dez passes consecutivos no campo ofensivo. A maioria deles, na maioria das vezes, quando está com a bola no campo ofensivo, não consegue chegar a esse número. Antes dessa marca ser alcançada, antes do décimo passe ser atingido, alguma coisa acontece. Pode reparar. Ou a bola é finalizada (para a interceptação da defesa, para fora, para a defesa do goleiro ou para o fundo da rede), ou a bola é perdida (um passe errado ou um desarme), ou a bola sai pela lateral, ou a bola sai pela linha de fundo (escanteio ou tiro de meta), ou a bola volta para o campo defensivo (quando a contagem é zerada), ou rola alguma jogada individual (com ou sem sucesso), ou (esta acontece com frequência) alguma falta é marcada. E por aí vai. Preste atenção. Repare nos jogos do Brasileirão, quando ele começar. Sempre há um desfecho desses antes do décimo passe ser trocado. Ou quase sempre.

O que isso quer dizer? Muita coisa.

Quer dizer primeiramente que a posse da bola não é valorizada. Quer dizer que, na hora do jogador tomar a decisão do que fazer quando está com ela no pé, valorizar a posse é uma das últimas das suas escolhas. Em regra ou ele vai tentar um drible, ou vai tentar um cruzamento para a área, ou tentar queimar para o gol se tiver a chance, ou vai tentar cavar uma falta, ou vai dar um passe forçado, um passe com baixa margem de segurança (em boa parte das vezes, vai errar). Raramente vai valorizar a posse da bola. Raramente vai tentar o passe seguro, o passe com boa margem de segurança. Em regra vai optar pela alternativa mais arriscada e muitas vezes menos eficiente, menos eficaz. Essa decisão (a meu ver equivocada) só é tomada, porém, porque o jogador não é orientado para fazer diferente, porque não é treinado para fazer diferente, porque não o explicaram como fazer diferente.

Como se valoriza a posse de bola? Justamente com a troca de passes curtos. O problema é que, sem compactação e movimentação, essa troca de passes se torna praticamente inviável. Essa troca de passes pacientes e seguros só pode ser bem sucedida se houver compactação. E no país do 7 a 1, no país do “4-1-4-1 é linha de ônibus” e “compactação é uma palavra que está na moda” (frases de um jornalista importante do SporTV), convenhamos que compactação não é um ponto forte (nas fases defensiva e ofensiva). Muito pelo contrário. É um ponto fraco. É um dos vários calcanhares de Aquiles. Portanto, antes de pensar em implantar a valorização da posse da bola na filosofia do jogo, é preciso aprender a jogar compactado. O problema é que, me parece, são raros os treinadores em atividade no Brasil que sabem como fazer isso. Em outras palavras, para aprender a valorizar a posse é preciso saber trocar passes, e para saber trocar passes é preciso jogar compactado, mas poucos treinadores do Brasil sabem compactar suas equipes. Ou seja, nosso futebol se encontra numa sinuca de bico.

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